Pelo buraco da porta

Pelo buraco da porta eu via o mundo.
Pelo buraco da porta eu via a felicidade.
Pelo buraco da porta eu via a infância.
Pelo buraco da porta eu via a liberdade.
Pelo buraco da porta eu sentia inveja.
Pelo buraco da porta eu sentia raiva.
Pelo buraco da porta eu sentia melancolia.
Pelo buraco da porta eu sentia a solidão.

O buraco da porta não era necessariamente um buraco, muito menos de uma porta, o buraco da porta era uma grade, que me distanciava da rua que eu achava charmosa e alegre, essa é a realidade de crianças cujo pais tem medo de deixar seus filhos usufruir do seu lazer na porta de casa com medo da vizinhança, com medo da violência e principalmente com medo das más influências. Moradores de bairros perigosos entenderão muito bem do que eu estou falando, a insegurança é tão grande que acabamos tirando o direito sagrado de uma criança de ter uma infância normal, trancafiando dentro de casa e soltando apenas em parques e com monitores não?, as grades que me prendiam são as mesmas que hoje prendem meu filho. 
Aos 8 anos não entendia porquê só eu não podia sair, porquê só eu não podia levar a bicicleta colorida que sonhei tanto em ganhar pra dar uma voltinha, hoje eu sei, hoje entendo perfeitamente, e infelizmente faço o mesmo ... por enquanto; essa não é a vida nem a lembrança que eu quero que ele leve pra vida, aliás nenhuma criança deveria ter sua infância roubada por culpa da violência, onde iremos parar ?!